segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Relaxa. Não adianta reclamar! - 12/02/2007

Relaxa. Aqui não adianta reclamar!

Sete e meia da manhã. Terça-feira. Mês de janeiro, muita gente querendo colocar a casa em ordem, inclusive eu. Aproveito meus últimos dias de férias para finalizar a averbação da minha casa. Mal sabia o que aquela manhã me reservava!

Ao chegar na Previdência Social, percebi que havia uma fila de mais ou menos trinta pessoas aguardando o início do expediente. Oito horas, os portões se abrem e a fila segue em direção a uma grande sala de atendimento, nos dirigimos para o fundo, onde se lia: atendimento especializado. Havia um balcão ocupado por três atendentes. Curiosamente a distribuição de senhas foi feita a partir da senha de número vinte e cinco. A minha era quarenta e nove. Na pior das hipóteses, acreditava que até as dez horas da manhã já teria pego a Certidão Negativa de Débitos-CND.

A equipe do atendimento especializado era formada por duas senhoras e um senhor. Este estrategicamente acomodado entre as duas atendentes. Explico o estrategicamente. Dos três o mais informado e que tinha alguma tolerância com o “público” era o senhor, que de tão solicitado pelas colegas, passou a ser conhecido também dos que ali aguardavam atendimento. Era o João! Entendia todos os procedimentos, daí a necessidade de sentar-se no guichê situado entre as duas outras. O João no final das contas demorava mais nos atendimentos, já que tinha de parar o seu serviço a todo minuto para socorrer as colegas que estavam a sua volta.

As pessoas, cidadãs, na maioria pessoas simples, sem nenhuma informação e conhecimento, chegam lá para se informarem e serem atendidas. Saem de lá piores do que quando chegaram. Quem atende, ao invés de dar as explicações e orientações necessárias, detem-se em dizer de forma brusca que não pode resolver, porque falta a documentação necessária. A postura inibidora dos atendentes faz com que as pessoas se recolham em suas insignificâncias e saiam com a impressão de que são muito limitadas. Como se ouvissem: seu ignorante, se não sabe o que quer, o que está fazendo aqui?

Em pouco tempo de espera, percebi que não seria atendida tão cedo, aconselhada pelo meu marido, procurei relaxar. Aproveitei para observar. Interessante o atendimento especializado que foi concedido a um senhor idoso. Ele chegou, sentou-se em frente ao primeiro guichê, cuja atendente era responsável pelas senhas especiais. Não se preocupou e provavelmente nem sabia das tais senhas e aguardou para ser atendido. Vi com naturalidade sua atitude, afinal o Estatuto do Idoso garante atendimento prioritário a eles. Entre o tempo em que a atendente se ocupou, pedindo informações ao João e justificando que o sistema acabara de sair do ar, passaram-se mais de uma hora e o idoso abandonado à sua frente. Acabei por esquecer também dele. De repente ouço a atendente dizer: Esse caso eu não atendo! Voltei os olhos para o guichê de atendimento de senhas especiais e vi que ela conversava com o idoso. Ele estava com uma carteira de trabalho nas mãos e mesmo com a negativa, não desistiu. Ela então se dirigiu ao João e voltou a dizer: Esse caso eu não atendo! O João se prontificou a atendê-lo. Como estava ocupado, virou-se para a colega da direita e perguntou se ela poderia ver o caso do idoso. Surpreendentemente, a atendente mais carrancuda se prontificou a atender o vovô. Só então é que de posse da carteira de trabalho do idoso, a atendente número três analisou e ouviu o que ele queria. Concluiu que o problema dele deveria ser encaminhado a outro órgão. A explicação que poderia ter sido dada logo no início, em respeito ao idoso, foi feita com mais de uma hora de espera!

Na nossa interminável manhã, às vezes fazíamos e ouvíamos comentários irônicos sobre a forma de tratamento aos usuários e a sensação de que não adiantava reclamar. Reclamar para quem, onde? De frente para as cadeiras de espera, fixada em um armário-arquivo havia o número do telefone da Polícia Federal. Só mais tarde entendi que, muito mais que informar, aquele número era para intimidar àqueles que perdiam a paciência com o atendimento negligenciado. Ouvi de uma das pessoas que como eu aguardava sua vez, que não adiantava ficar nervoso, porque os servidores chamavam a PF e o cidadão exaltado, ainda poderia ser enquadrado por desacato à autoridade! O curioso é que não visualizei ali os números dos telefones da Ouvidoria e da Corregedoria da Previdência Social.

Eram doze horas e quarenta minutos quando chamaram a senha quarenta e nove. Havia chegado a minha vez. Foi o João que nos atendeu. Ele logo foi perguntando por que demoramos solicitar a CND, já que havíamos pago a guia de recolhimento em agosto passado. Meu marido não deu ouvidos à pergunta. Eu não prossegui com a conversa, até por medo de retaliação. Tive vontade de responder: João, não viemos antes, porque em tempo normal de trabalho, seria impossível ficarmos cinco horas e 10 minutos longe aqui, sem nos prejudicarmos no nosso trabalho!

Não está na hora de mudarmos a nossa prática diária nos nossos locais de trabalho? Se não sensibilizarmos em relação ao respeito com o outro, percebendo o humano, sensibilizemos então, com as mudanças que nos são impostas pelo avanço e ocupação cada vez mais efetiva dos sistemas de informação em todos os espaços. As máquinas podem até não resolver todos os problemas, mas são re-programáveis e mudam, basta a lógica da sociedade de consumo visualizar a necessidade de se adequar às novas exigências de mercado.


Geralda C. Teixeira Ferraz
Gerente de Comunicação da SSP- Servidora Pública Estadual

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