sábado, 3 de outubro de 2009

Mulher e mídia - Conceitos que levam ao preconceito

O que dizer de peças publicitárias veiculadas nos meios midiáticos, que primam pela qualidade técnica e se propõem perspicazes e inteligentes? Que alteram a percepção da realidade, reforçam conceitos e preconceitos e legitimam valores morais?



Outro dia, enquanto transitava pelo Centro da Capital, nas proximidades do Teatro Goiânia, meus olhos se depararam com uma peça publicitária de uma das maiores cervejarias brasileiras, trazendo uma frase que faz um trocadilho com o ditado popular, “Onde passa um boi, passa uma boiada”. O trocadilho substituiu o substantivo masculino ‘boi’, pela marca da cerveja, e o substantivo feminino ‘boiada’ por ‘mulherada’! O gênio de criação da peça publicitária, tentou matar dois coelhos de uma vez só: relaciona o ditado a vocação agropecuária do nosso Estado e de quebra, vincula a ideia de que onde passa a tal marca de cerveja, certamente passará mulheres aos montes, verdadeiras manadas de vacas!



Não é de hoje que as imagens das mulheres esculturais, loiras saradas, servem de inspiração aos publicitários que buscam seduzir e povoar o imaginário dos homens. As peças publicitárias cumprem o papel de desumanizar e reduzir as mulheres à dimensão de fatias bem torneadas de músculos de carnes a espera do consumo, como pontua a jornalista Raquel Moreno, no livro A beleza impossível. É a própria coisificação preconizada por Marx.



Também não é de hoje que organizações feministas chamam a atenção para o tratamento dado às mulheres pela mídia. As mulheres representam hoje mais de 50% da população, têm grau de escolaridade superior a média dos homens e ocupam uma grande fatia do mercado de trabalho, estando presentes em grande número, inclusive, nas redações de jornais. Estas mulheres, protagonistas de suas histórias, de acordo com levantamento feito pela assessoria de comunicação da Semira (Secretaria de Políticas para Mulheres e Promoção da Igualdade Racial), em 2007 e 2008, são invisíveis para a grande mídia. Elas só ganham visibilidade, só se tornam notícia quando são vítimas de violência ou estampam colunas de jornais com pouca ou nenhuma roupa, em poses sensuais nas páginas dos jornais. Na verdade os dados ratificam uma realidade não só local. Esta é uma tendência mundial. A imagem das mulheres para os meios midiáticos está vinculada a ideia de objeto de consumo. Mulher é igual a erotização, banalização, mercadoria.



Infelizmente tais abordagens reforçam conceitos ideológicos de perpetuação da cultura machista e consequentemente da prevalência da força e da violência. Em um outro trecho do livro A beleza impossível, Raquel Moreno, menciona que a mídia da forma que preconiza a imagem da mulher, faz o caminho da sedução palmilhado de produtos, brilhos, atitudes e aparências que ratificam os conceitos de força, domínio, desejo e submissão entre os sexos.



Faz-se necessário que o(a)s profissionais de publicidade comecem a ter uma postura mais comprometida e conseqüente em relação ao produto que se pretende vender e a mensagem que se pretende passar para o(a) seu consumidor(a). Acreditando que “Um outro Mundo é Possível”, cresce a máxima também entre o mundo empresarial, de que somos co-responsáveis pela mudança de paradigmas, pela mudança de atitudes frente ao mundo individualista de violência e morte. Enquanto a mídia insistir na massificação de conceitos machistas de posse, objeto e domínio ela estará contribuindo para a perpetuação de atitudes que levam a violência e a morte, deixando escapar a oportunidade única de contribuir na formação de cidadãs e cidadãos mais humanos, iguais!
Publicado no jornal "O Popular" - 02.10.09