domingo, 16 de fevereiro de 2014

As crianças no tempo de minha avó

Filhas, netos, bisnetos e tataranetos da vó Mariquinha
Outro dia fui ao aniversário de 81 anos de uma das muitas tias que  tenho, a tia Maria, irmã de meu pai. Minha infância foi recheada de tios, primos e avô. Avô por parte de pai, porque meus avós maternos não os conheci, Também não me lembro da minha avó por parte de pai, a Mariquinha, mas essa virou lenda. Desde pequena sempre ouvi muitas histórias a seu respeito. Mulher que a vida lhe exigiu que fosse forte para cuidar dos 12 filhos. Mulher que acostumou-se com a rudeza da vida e das palavras. Por ser a primogênita, teve poucos privilégios. Trabalhou muito e não se fez de vítima, pela herança machista. Para criar seus filhos com dignidade, aprendeu que teria que lidar com firmeza, muitas vezes confundida com mulher de pavio curto. Tinha iniciativa e não se dava por vencida diante dos problemas que a vida se encarregava de colocar pelo seu caminho.

Diz a lenda que vó Mariquinha, que era mineira, veio com marido, filhos, pais e irmãos para Goiás, na época da construção da estrada de ferro, na boleia do caminhão.  Depois de morar em algumas fazendas, acompanhando o marido e os filhos, veio para Goiânia morar  numa casa nos arredores da Vila Santa Helena. Vó Mariquinha, tomava a iniciativa de resolver os problemas da família com os políticos da época. Não se fazia de rogada, ia a pé até o Palácio das Esmeraldas para falar com o governador, à época, Pedro Ludovico Teixeira, pedir emprego, tratamento de saúde, ou qualquer outra coisa que precisasse,  não aceitava "não" como resposta. 

Pois bem, tive a oportunidade de ouvir mais uma dessas histórias, essa inédita, na festa da tia Maria. Foi contada por sua filha Letícia. Apesar de engraçada, refletia a cultura e a educação de uma época, onde criança não podia expressar sua opinião, sob pena de levar umas boas chineladas, sem contar que era visto como criança mal-criada. Não é como hoje, que felizmente temos acesso a informações, a estudos e entendemos que as fases do desenvolvimento infantil devem ser respeitadas. Sabemos até que,  assim como os adultos elas são signatárias de direitos.

Vamos a história. Durante a festa da minha tia Maria, havia algumas crianças correndo e brincando pelo salão, tia Letícia, então fez questão de comentar a diferença da educação dos tempos atuais e dos tempos de sua juventude. Conta ela que Elicimar, um dos netos da minha vó Mariquinha, filho da minha tia Lourdes, que deveria ter em torno de três anos de idade, estava passeando na casa dela e ouviu quando ela lá da cozinha pediu o tempero para a comida que estava cozinhando: - Letícia, traz o 'sali', pra mim. Elicimar ouviu atentamente e não teve dúvidas, foi em direção da vó Mariquinha e a corrigiu: - Vó, não é 'sali', é sal! Foi o suficiente para ela ir tirar satisfação com a filha Lourdes, mãe do Elicimar, dizendo que ela precisava dar educação pro filho, que mal havia saído dos 'cueiros' e já estava querendo ensinar ela, que era sua avó. Aquilo era imperdoável e ela exigia que a mãe lhe desse umas boas palmadas para que ele aprendesse a respeitar os mais velhos! Era assim.